Com apenas 40 anos de idade, Mike Bartlett é um dos mais expressivos, incensados e premiados autores do teatro contemporâneo inglês. Com uma intensidade sombriamente engraçada, o autor coloca o foco de seu teatro no duelo entre o homem e os padrões de conduta exigidos pela sociedade, debruçando-se, entre outros temas, sobre questões como o fim do casamento, a sexualidade e o abuso de poder no ambiente profissional. É deste último que se trata a obra O Contrato, escrita em 2008 e que já recebeu duas importantes montagens no Brasil. Nela, Bartlett parece ter profetizado a frase “O particular acabou” – tão verdadeira nestes tempos em que a fronteira entre o universo pessoal e o público parece ter sido derrubada de vez com as redes sociais – ao lançar a questão: “Até que ponto você chegaria para preservar seu emprego?”

A peça possui apenas duas personagens: “Anna” e “Gerente”. No escritório de uma grande corporação, “Gerente” solicita que a funcionária “Anna” leia em voz alta uma cláusula do contrato que assinou ao ser admitida, que proíbe aos colaboradores qualquer relação amorosa ou sexual com outro colega da empresa. Nos encontros seguintes, “Gerente” libera suas diferentes facetas para manipular Anna. Para manter seu emprego, a funcionária acaba por se render e danificar sua vida privada. A temática da liberdade – ou a falta dela – vai se impondo aos poucos, através de encontros recorrentes entre as duas personagens, separados por períodos de tempo, às vezes mais curtos, às vezes mais longos. A reflexão sobre o abuso de poder se expande para a perda da humanidade, e o rumo tomado pela história caminha aos poucos para o imprevisível e, algumas vezes, o chocante.

Esta obra, ao mesmo tempo cruel e engraçada, à primeira vista nos demonstra a faceta mais absurda de uma situação comum de trabalho. Mas nos revela também que o “futuro não muito distante”, retratado em 2008 quando foi escrita, pode já estar acontecendo aqui e agora, diante de nossos olhos estarrecidos.